quinta-feira, 27 de agosto de 2009

SERIAL CRISES...

FONTE: Ivan de Carvalho (TRIBUNA DA BAHIA).

Eis porque não me ufano do meu país, contrariamente ao que gostaria.
A ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira, foi exonerada do cargo e fez uma denúncia em entrevista à revista Veja, depois confirmada em depoimento no Senado, com o acréscimo de uma verdadeira enxurrada de detalhes.
Dizia, primeiro, que foi pressionada com um pedido “inapropriado”. Depois, no Senado, corrigia para livrar-se de eventual processo judicial – já que não dispunha de provas materiais –, afirmando que não se sentiu pressionada pelo pedido da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para agilizar o processo de fiscalização que envolvia o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado e ex-presidente da República, José Sarney.
Disse ainda que considerou o pedido da ministra e candidata do PT à sucessão do presidente Lula “inapropriado”, embora “normal” dentro da prática política.
É evidente que esta linguagem cheia de idas e vindas sobre ter havido pressão ou não e de paradoxos como considerar “normal” o que também é “inapropriado” teve o evidente objetivo, talvez já sob orientação de advogados, de evitar a hipótese de processo judicial por calúnia e difamação, já que não dispõe Lina Vieira de provas materiais que lhe permitam demonstrar a acusação contida na entrevista à Veja.
Mas o caso, afinal, já abriu várias crises. Uma, na candidatura presidencial da ministra Dilma Rousseff. Outra, por consequência, no governo e no PT, que estavam dispostos a eleger “um poste” – representado pela ministra que antes jamais se interessara pelo aspecto eleitoral das coisas. Outra, ainda, entre o governo e o PT, de um lado e o PMDB, de outro. É que este partido, apesar de ferido pelo escândalo que envolveu e ainda envolve o presidente do Senado, José Sarney, e de haver recebido do PT, do presidente Lula e de sua candidata Dilma Rousseff o apoio que permitiu salvar a presença de Sarney no cargo de presidente do Senado e até, quem sabe, sua permanência no mandato de senador, percebeu a fase de fraqueza em que estão a candidata, o PT e o próprio governo.
E este é o momento politicamente apropriado para a apresentação de faturas políticas, para reajuste do preço cobrado pela aliança. E transita essa cobrança desde exigências mais incisivas em torno das sucessões estaduais de governador até o calundu de não votar nada no Congresso – e para isto, conta com o restante da base governista, exceção feita, talvez, do próprio PT – sem que o governo resolva a questão da não liberação e dos cortes de recursos previstos no Orçamento graças a emendas parlamentares.
Acaba aí a série de crises? Não. Como os anglo-saxões, ingleses e americanos, inventaram os serial killers, os brasileiros inventaram as serial crises. E por conta disso lavra e se aprofunda uma crise na Receita Federal, detonada a partir do caso Lina Vieira e ampliada com as demissões voluntárias de, até ontem a noite, mais de três dezenas de altos funcionários.
Ontem foram 24 só de São Paulo, antecedidas de demissões de coordenadores e superintendentes regionais de vários Estados.
As alegações são duas: solidariedade a Lina Vieira e solidariedade à filosofia que ela representava e que estaria sendo abandonada – a de priorizar a fiscalização de grandes contribuintes. Isto, aliás, do ponto de vista dos objetivos de obter mais arrecadação, está absolutamente correto para uma Receita Federal que não tem ainda os instrumentos para considerar “prioritários” todos os contribuintes. Os demissionários alegam que agora a Receita estaria mudando de filosofia e se dispondo a fazer fiscalização “sobre recibos de médicos”.

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