terça-feira, 24 de novembro de 2009

DO AMOR À FARDA AO MEDO DA MORTE...

FONTE: Daniela Pereira (TRIBUNA DA BAHIA).
“Tomem cuidado porque foi mais um policial que morreu. Até breve meu filho, um dia nos reencontraremos”. Com essas palavras, a mãe do aluno curso de formação de oficiais da Polícia Militar, Elton da Silva Mota, de 23 anos, assassinado no último domingo, alertou aos amigos do filho que estavam presentes sobre o perigo da profissão escolhida. Miguel Bastos da Silva Mota de 64 anos, pai da vítima, desejou ao filho, sob muitas lágrimas, um descanso eterno. O enterro de Elton foi realizado na manhã de ontem no Cemitério Bosque da Paz.
O aspirante foi morto por dois homens durante um assalto ocorrido na Rua Luís Régis Pacheco, bairro do Uruguai. Ao localizar a arma do rapaz, no banco do veículo, um dos bandidos disse: “Se você é policial, você vai morrer”. Em seguida, disparou três tiros contra a cabeça do jovem, usando a própria arma da vítima, que se tornaria soldado da PM no primeiro semestre de 2010.
Elton foi enterrado com menções honrosas de um Militar. Além de familiares, representantes da PM, 300 alunos e 50 oficiais da Academia de Formação compareceram ao local para prestar as últimas homenagens e solidariedade à família da vítima. Abalados, os cadetes se abraçaram e choraram enquanto acompanhavam o cortejo.
De acordo com o coronel Rivaldo Ribeiro, diretor da Academia de Formação de Oficiais da Polícia Militar, Elton foi um aluno exemplar que trouxe orgulho para a corporação. “Ele cumpria as obrigações e tinha uma ficha digna de elogios. Somos cidadãos comuns e nos nossos momentos de folga corremos riscos. Mas a polícia esta tomando medidas para conter essas ocorrências”, afirmou. Em relação à arma utilizada pelo aluno, o coronel afirmou que existe a permissão, se o revólver for adquirido com legalidade no comércio formal. “Assim como todos, os policiais são cidadãos comuns e, infelizmente, não estão protegidos da criminalidade. Sei que é proibido, mas desde o meu primeiro ano na academia, ando com duas pistolas. Em primeiro lugar preciso cuidar da minha segurança”, afirmou um cadete da mesma turma de Elton.
RELATOS DA ROTINA DE UM PM.
Acordar, levar o filho à escola e seguir para o trabalho, uma Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM). Essa é a rotina do soldado Mata, policial militar há 8 anos. Se não fosse pelos perigos que a carreira militar oferece, esse percurso poderia parecer uma rotina de extrema normalidade. Em 2008, 34 policiais militares foram assassinados na Bahia. Este ano, já são 18 policiais mortos.
Um garoto forte e saudável que desde os 6 anos de idade sonhava ser militar. “Certa vez, no quintal de casa, coloquei fogo em duas camisas minha para fingir ser bombeiro. Levei uma surra daquelas”, relembra com sorrisos, hoje aos 32 anos. Fotos na parede da passagem pelo Exército evidenciam o orgulho e amor pela farda. Aos 24 anos, Edson Menezes Mata comemorou o ingresso na PM. Porém, o orgulho do exercício da profissão fica atrás do sentimento de medo que, nos últimos anos, tem tomado conta dos policiais militares. Atentados, saidinhas bancárias, assaltos em coletivos e troca de tiros são alguns dos fatores mais comuns para ocorrências contra esses profissionais. Moradores geralmente de bairros periféricos, os policiais sentem-se indefesos à criminalidade e precisam, na maioria das vezes, omitirem para vizinhos a função que exercem.
De acordo com o diretor da Academia de Formação de Oficiais da Polícia Militar, Coronel Rivaldo Ribeiro, os dados de mortes de PM’s na Bahia são preocupantes e a Polícia Militar tomará medidas para que esse número não cresça. “Estamos sempre adotando medidas de Serviço de Inteligência para verificarmos os locais de riscos e, com o apoio do Ministério Público, tirar de circulação esses malfeitores”, garantiu o Coronel. Segundo psicólogos, a tensão diária vivida por um policial, assim como os crimes contra eles noticiados constantemente pela mídia, podem acarretar em problemas de ordem social e de cunho psicológico, principalmente para os filhos. Com uma renda de R$ 1.200 mensal, o soldado Araújo, lotado na 11ª CIPM, conta que mesmo que ganhasse o dobro do que ganha, não valeria o desgaste que enfrenta no desdobramento da profissão. “Dinheiro nenhum vale uma vida, mas ganhamos muito pouco para sair de casa e não saber se voltaremos”, afirma. Pai de três filhos, Araújo ainda garante que tenta não levar os problemas e estresses sofridos na rua para dentro de casa.
“Tem um bom tempo que não sei o que é frequentar uma praia. Outro dia seguia para o trabalho, quando passei pela Rótula do Abacaxi, tive a impressão que dois elementos em uma moto estavam me perseguindo. Fixei meus olhos no carona e, confesso a você, que já estava com a mão na minha pistola, pois se ele fizesse qualquer movimento suspeito eu iria atirar, ou seja, tiraria a vida de um inocente porque, nós já andamos assustados”, contou um civil da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos.
Apesar de todas as dificuldades, há quem garanta que a carreira militar é uma das mais concorridas e procuradas pelos jovens baianos. Diversos fatores podem incentivar esse ingresso, como por exemplo: estabilidade financeira, vocação ou simplesmente, como afirmou o aspirante Paulo Sérgio, “amor à farda”.

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