sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

AS VAIAS, A PONTE E O TÚNEL...

FONTE: Ivan de Carvalho (TRIBUNA DA BAHIA).

Recentemente, o jornalista Levi Vasconcelos flagrou, em um restaurante da moda na Pituba, militantes petistas planejando vaiar Caetano Veloso “nos circuitos nobres” do Carnaval baiano.
A vaia seria (ou será) porque Caetano não vai votar na candidata do PT a presidente e/ou porque ele aplicou alguns adjetivos desagradáveis a Lula. Teria (ou terá), evidentemente, índole intimidatória, de terrorismo político-psicológico, de patrulhamento de ideias, na rota da Polícia do Pensamento de que fala Orwell em seu romance 1984. Regina Duarte (lembram-se?) disse que tinha medo.
Em entrevista, explicando que votará na candidata do PV a presidente, a senadora Marina Silva, disse o compositor baiano exatamente o seguinte: “Marina é Lula e é Obama ao mesmo tempo”. “Ela é meio preta, é cabocla, é inteligente como o Obama, não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro. Ela fala bem”.
Foi o bastante. O PT subiu nos cascos. Lula respondeu. Dona Canô, mãe de Caetano, pediu desculpas. Caetano cantou “Eu não peço desculpas e nem peço perdão”. Apesar do desmentido do presidente estadual do PT, Jonas Paulo, a vaia vem sendo estimulada. Isso reportou, no programa Balanço Geral, da Rede Record, o apresentador Raimundo Varela, que não é do PT. Ante sua grande audiência, lamentou um comentário de Caetano, afirmando que este declarou que o Carnaval é uma coisa “muita chata” e em seguida lembrou a ideia das vaias como uma coisa que está viva. Ora, quem sabe Caetano – mito e herói construtor do Carnaval baiano – está achando (se está) o Carnaval uma “coisa chata” para preparar a explicação de não comparecer e, assim, por-se fora do alcance de vaias. Com o que perderia mais o Carnaval do que ele. Os petistas, pelo contrário, aparentemente ganhariam. Mas às vezes as aparências enganam.
Há, no entanto, uma flagrante injustiça nessa história. Se Caetano deve ser vaiado pelo que falou, pelo que escreveu, que vaia monumental merece João Ubaldo, pelo monumental artigo atacando a ponte monumental... Ubaldo falou da extinção da “Itaparica do meu coração” em holocausto aos “sacerdotes de Mamon”.
Mas talvez haja uma alternativa conciliadora. Os sacerdotes de Mamon não poderiam fazer a exploração destrutiva da Ilha, mas se fartariam muito mais na própria obra. Ao invés de ponte, um túnel. Não romperia a paisagem azul de Todos os Santos, passaria mais perto do Inferno, se este for realmente “em baixo”.
Sob as águas da baía, por baixo da Ilha, saindo um ou dois quilômetros continente adentro, em rodovia da qual ninguém poderia sair ou fazer retorno nos 100 primeiros quilômetros. Assim, não valeria a pena emergir do túnel e rodar 200 km para chegar à Ilha. Maiores túneis existem, o Túnel de Seikan, que liga as ilhas de Hokkaido e Honshu, no Japão, e o Eurotúnel, sob o Canal da Mancha, ligando a Inglaterra à França/Europa, com 50,5 km, muito mais que os 12 ou 13 da ponte proposta para a baía da Bahia. O túnel baiano, pois, é viável.
Enterrado no chão, o túnel não seria muito visto, mas isso também tem uma solução monumental: duas estátuas de minhoca, uma em cada boca do buraco.

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