terça-feira, 29 de junho de 2010

VIDA PÚBLICA DOS CANDIDATOS À ELEIÇÃO ESTÁ NA MIRA DA SOCIEDADE BRASILEIRA...

FONTE: Leo Barsan, TRIBUNA DA BAHIA.

Antes mesmo que a Lei da Ficha Limpa, que torna inelegíveis pessoas julgadas criminosas por um colegiado de juízes, fosse sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), em 2008, já havia tomado a iniciativa de divulgar em seu site nomes de candidatos a prefeitos e vice-prefeitos que tinham pendências perante o Poder Judiciário.A intenção, segundo Mozart Valadares, presidente da AMB, era de garantir à sociedade uma margem de segurança maior quando do momento de escolher um representante público. Mesmo em meio a críticas, a Associação perseverou na luta pela moralização da vida pública. Dois anos depois, a entidade vê aprovada uma lei que atende “exatamente” aquilo que antes era pleiteado.Mas, para Valadares, que também lutou pelo fim do nepotismo, denunciando casos praticados no Judiciário de Pernambuco e conseguiu grandes vitórias no Conselho Nacional de Justiça, como a recente determinação de demissão de casos de nepotismo-cruzado identificados no Tribunal de Justiça daquele estado, a aprovação da lei, por si só, não resolve. Ele destaca, em entrevista exclusiva à Tribuna, que a sociedade precisa participar mais no processo de fiscalização da vida pública de candidatos ao parlamento.O presidente da AMB revela também que veio a Salvador para um encontro com a presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, desembargadora Telma Brito, a fim de que, juntos, encontrem saídas para as dificuldades administrativas enfrentadas pelo Judiciário baiano. Na visão de Valadares, a magistratura baiana, quase na totalidade exerce suas atividades com ética e decência. Ele reconhece a existência de falhas, mas destaca que, entre os Três Poderes, o Judiciário é o que mais avançou.

TRIBUNA DA BAHIA. – Principalmente em ano eleitoral, é importante que a sociedade conheça bem aqueles que postulam vagas de representantes do povo. O presidente da República aprovou, portanto, a Lei 135/2010, conhecida por Ficha Limpa, que confere maior transparência sobre a vida dos candidatos ao parlamento. Mas, antes mesmo da aprovação da nova lei, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) deu uma espécie de pontapé inicial no que diz respeito à moralização do exercício da vida público-partidária. Como este processo foi iniciado?
MOZART VALADARES – Na realidade, em 2008, por ocasião das eleições municipais, a AMB disponibilizou em seu site nomes de candidatos a prefeitos e vice-prefeitos que tinham pendências perante o Poder Judiciário, nas cidades com mais de 100 mil eleitores. Fizemos isso sem qualquer juízo de valor, sem qualquer pré-julgamento, apenas a título de informação para a sociedade, a fim de que ela tivesse uma margem de segurança maior na hora de escolher os seus representantes.

TB – À época, no entendimento da AMB, qual seria a maneira mais adequada para impedir, de fato, novos registros de candidaturas de políticos com pendências no Judiciário?
MV – No mesmo ano, ingressamos com uma ação perante o Supremo Tribunal Federal pedindo à entidade que desse uma declaração de que não era necessário o trânsito em julgado da sentença. A proposta era que o juiz responsável pelo registro de candidaturas faria uma análise da vida pregressa dos candidatos e teria a liberdade e a independência de indeferir os registros, caso observasse que mesmo sem o trânsito em julgado da sentença, o processo era grave e ele estaria inabilitado para a atividade pública.

TB – A solicitação foi acatada?
MV – Infelizmente o STF, por maioria de votos, entendeu que era necessário o trânsito em julgado da sentença. Mas essas duas ações da AMB em 2008 trouxeram esse assunto para a pauta nacional tanto na mídia quanto no Congresso. E hoje nós temos uma lei fruto dessa luta e que atende exatamente o que a AMB havia pedido ao Supremo.

TB – A postura assumida pela AMB suscitou alguma crítica?
MV – Sim. Fomos criticados naquela época por essa questão da moralização. Disseram que não era atribuição de magistratura, mas hoje temos o reconhecimento nacional. É uma lei que vai permitir às futuras gerações que não sofram com maus agentes na vida pública. É a nossa responsabilidade. É o amadurecimento da democracia.

TB – O que significa, em termos práticos, esse amadurecimento da democracia?
MV –
A Ficha Limpa vem prestar transparência e mais moralidade à política do país. Então, interpretamos que é um grande avanço na linha de combate à corrupção na atividade partidária. Nós vamos qualificar melhor a nossa representação política tanto no Legislativo quanto no Executivo, e essa contribuição foi dada pela AMB. Na realidade, essa é uma vitória, uma conquista da sociedade brasileira.

TB – Conquista da sociedade brasileira. Mas, somente a aprovação da lei resolve?
MV – Várias entidades, a exemplo da CNBB, se engajaram para a aprovação da lei. Sem dúvidas, a mobilização da sociedade garante um retorno positivo. Mas, é igualmente importante que a sociedade se conscientize sobre o seu papel no fortalecimento da democracia para que escolha melhor os seus representantes e acompanhe mais de perto a atividade política no país, para que haja melhorias não só na classe política, mas em toda função pública brasileira.

TB – O acompanhamento da vida pública brasileira garante maior segurança na hora de votar. Mas, quais são os mecanismos que a população dispõe para obter informações sobre o comportamento dos candidatos?
MV – Não há mais justificativas para que não façamos escolhas corretas. Temos mecanismos de acompanhamento das atividades públicas no Brasil. As TV’s Senado, Câmara, Justiça são alguns deles. A sociedade tem nas mãos a oportunidade de renovar dois terços do Senado Federal este ano, por exemplo. São crises ética e moral como nunca foram vistas na história desse país. É preciso participar efetivamente da atividade pública do país.

TB – Quando do momento do registro da candidatura, como se dá a avaliação do processo?
MV – A AMB protocolou no Tribunal Superior Eleitoral um pedido para que todo candidato, no ato do pedido de registro da candidatura, obrigatoriamente, noticie ao Judiciário se responde a ações criminais. Não bastar citar o número da ação e o nome. É preciso informar um histórico atualizado. A sociedade vai ter a oportunidade de conhecer melhor os seus candidatos. Isso é imprescindível na democracia, pois vivemos em um contexto onde pagamos, talvez, a maior carga tributária do mundo. A sociedade é quem paga o meu salário, o do senador, do governador. Ela tem direito a informações, direito de saber o comportamento de quem exerce a vida pública. Nós temos o dever de prestar contas.

TB – Com a lei em vigência já nas eleições deste ano, para a AMB, qual a principal vantagem que a Ficha Limpa traz?
MV – Haverá até uma intimidação da parte de quem pretende se candidatar. A lei vem a ser uma mudança de cultura onde as pessoas que querem permanecer ou entrar na vida pública têm que defender o interesse coletivo e não tirar proveito dela. Todas essas vantagens são decorrentes da aprovação dessa lei. Diante de tantos mecanismos que existem hoje para acompanhamento da vida pública, a exemplo da internet, se o Senado, a Câmara, não cassam mandatos por corporativismo, nós temos o nosso voto, um instrumento que pode cassar o mandato de qualquer pessoa. Chegou a oportunidade da sociedade de fazê-lo.

TB – A convite da juíza Nartir Dantas Weber, presidente da Associação dos Magistrados da Bahia (Amab), o senhor veio a Salvador para uma visita à presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, desembargadora Telma Brito. Qual foi o teor da conversa?
MV – A visita foi para tratar de algumas dificuldades administrativas pelas quais o Poder Judiciário da Bahia vem passando. Fizemos um apelo para que o Conselho Nacional de Justiça pudesse ajudar o Judiciário baiano. Vim comunicar à presidente do TJ que tive um encontro com ministros do Conselho e notei a disponibilidade deles em ajudar. Também coloquei à disposição do TJ da Bahia, a Associação que presido.

TB – Que dificuldades administrativas são essas e de que forma a AMB pretende ajudar?
MV – São acúmulos de equívocos que em algum momento estouram e vai ser preciso cortar na própria carne, vai ter que ajustar e tomar algumas medidas amargas, doloridas, mas para corrigir enganos cometidos ao longo do tempo. Questões salariais, morosidade, entre outros pontos que não são exclusivos daqui. A Bahia foi a última unidade federativa a fazer a revisão dos salários da magistratura. Diante de todas essas questões, nós temos que tomar medidas de saneamento de algumas mazelas do passado para que a gente possa fazer concursos, colocar mais funcionários, mais juízes, qualificar melhor os servidores, informatizar o Poder, com o intuito de melhorar o nosso serviço perante a sociedade.

TB – Que avaliação a AMB faz sobre a magistratura baiana?
MV – A AMB enxerga a magistratura baiana de forma positiva. Quase na totalidade exerce suas atividades com ética, com decência. Agora, como em todo conjunto da obra humana, nós temos nossas falhas, deformações que estamos combatendo. Dentro dos três poderes, o Judiciário é o que mais avançou, e isso, graças às nossas próprias atitudes. Fomos os primeiros a combater o nepotismo, por exemplo. Estamos fazendo um esforço muito grande para corrigir essas questões. Melhorar a gestão para dar mais qualidade. Somos funcionários da sociedade. Precisamos estar em sintonia.

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